Criptocrise: Petro, a nova moeda digital venezuelana

 

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Foto: Plano Brasil/Reprodução 

Sair da sufoco. Essa é a intenção da Venezuela e de seus representantes.

Em uma mistura de tecnologia financeira e ânsia por dizer adeus à crise socioeconômica sem precedentes, o governo venezuelano colocou a criptomoeda Petro em suas primeiras atividades oficiais.

O nome é sugestivo. Isso porque a moeda virtual é lastreada (ou indexada) à massiva reserva de petróleo que tem o país caribenho. Isso não significa, por outro lado, que uma unidade corresponda a um barril da commodity, mas sim a seu preço.

Hoje, um tonel custa por volta de U$ 60 dólares. E é justamente nessa relação de preço que gira os rumores e as difíceis previsões.

A agenda 

O governo do presidente Nicolás Maduro anunciou oficialmente, entre os dias 20 e 21 de fevereiro, a pré-venda da moeda. Na primeira remessa, cerca de 38 milhões unidades. Em um mês, a Oferta Pública Inicial deve acontecer, com mais 44 milhões sendo disponibilizados. A ideia é chegar em 100 milhões. 

Ponto fora da curva 

A “bitcoin caribenha” já nasce diferente. Enquanto o sucesso das moedas computadorizadas se deu, principalmente, por se tratar de uma atividade financeira sem a presença de um Banco Central (ou seja, descentralizada), o Petro nasce por iniciativa de um Estado em questão.

Ainda que mostrando pioneirismo, o cenário passa longe de ser positivo. O país recorre à solução tecnológica devido à grave crise econômica que já se alastra há anos. A derrocada é tão grande que cem mil bolívares equivalem a menos de meio dólar.

Para que o fosse bom negócio para as contas do nação, a lógica da existência da moeda é ditada pelo chamado Livro Branco (Libro Blanco). O que ele regulamenta?

  • Oferta fixa
  • Petros poderão ser “minados” por novos usuários, com o aval dos detentores da moeda, com restrição à oferta máxima de 100 milhões de unidades
  • No momento do câmbio (caso já tenha a moeda em posse) o valor será pago em Bolívares, justamente para buscar aliviar a hiperinflação

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Livro é usado em casos de informações entre governos e opinião pública (foto: Banca y Negocios)

O Da Fronteira Pra Lá conversou com um especialista para tornar o assunto mais claro. Confira: 


A mecânica as perspectivas 

Segundo o professor Pedro Raffy, economista e Doutor em integração da América Latina pela USP, não há garantia de que o mercado funcionará normalmente, com compradores e vendedores agindo livremente.

Isso, segundo ele, acontece porque, até agora, as ofertas são direcionadas a investidores institucionais. Em outras palavras, não se destina propriamente à população comum, como no caso das outras centenas de moedas.

“Até o momento, não há muita clareza”, aponta.

Em princípio, a natureza monetária desindexada das moedas – e que não acontece no caso do Petro – mostra uma mecânica diferenciada. Ela surge diante de uma série de imposições externas de outros governos, principalmente dos Estados Unidos.

Desde o tour do embaixador Rex Tillerson a uma série de países latinos, os ataques diretos à política de Maduro deixaram ainda mais aquecidas as perspectivas econômicas.

Tillerson já foi presidente da Exxon Mobils, empresa do ramo petrolífero, e as duras palavras foram quase uma disputa pessoal.

A gestão em ruínas aliada a um enforcamento internacional, gera o esfacelamento da atividade econômica venezuelana.

“Isso desincentiva investidores a comprarem títulos, muito por conta da falta de credibilidade do país diante da esfera de investimento estrangeiro”, aponta Raffy.

Outro aspecto que agrava o descrédito acontece nas regulamentações específicas. Embora o governo tenha anunciado que haverá uma limitação de oferta, não há garantia.

Segundo o economista, o próprio lastro no petróleo não garante que, de fato todo, o montante de Petro será convertido no bem físico já que as própria petrolíferas passam por forte depreciação.

A crise estrutural do ramo é um problema a mais a se enfrentar. O problema de liquidez, resumido pela capacidade de converter um ativo em dinheiro, é outro fator que divide opiniões.

Como o relação Petro-Petróleo será praticamente direta, é de se esperar grande volatilidade. O professor aponta, ainda, para a oscilação no preço dos barris, que ditarão os preços da cibermetal: “Em um curto espaço de tempo, já se viu o valor cair de 150 dólares para apenas 20 ou 25. É preciso ver se o governo conseguirá manter a paridade”, encerra.

Em um contexto macroeconômico de inflação alta, descontrole dos gastos públicos,  difícil apostar as fichas em uma poder que pode, a qualquer momento, se tornar inadimplente.

Voz contrária 

Outro ponto que coloca a recente criação financeira em cheque é a crítica da oposição. Encurralado por Maduro desde a criação da Assembleia Constituinte em 2017, com presos políticos e muitos confrontos públicos, o lado contrário ao poder acredita que o fato seja uma manobra para emissão de dívidas públicas.

A declaração se baseia na impossibilidade do governo poder refinanciar dívidas, por sanção dos norte-americanos. Segundo os opositores, seria uma forma de fazer tudo de forma sorrateira.

De certa forma, há um motivo para isso acontecer. Mas não é o que agrada os rivais do regime socialista.

Em linhas gerais, a criação do Petro chega como uma das poucas alternativas a uma economia já desmantelada. O sucesso ou não da novíssima moeda estará condicionada na confiança.

Em um rebuliço cheio de incógnitas, falta de alimentos básicos nos mercados e uma onda migratória intensa, que já colocou mais de 40 mil refugiados através das fronteiras de Roraima, a Venezuela se encaminha às eleições de 22 de abril sem saber, sequer, quais serão os números do dia seguinte.

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